Em várias regiões do planeta, a situação social e política encontra-se no momento em turbulência. A relação entre arte e política é constantemente tema de discussão. Os cineastas devem se posicionar politicamente com mais veemência?
Sarah Ward - Austrália: A política pode moldar a arte de várias maneiras e a arte, por sua vez, tem muitas possibilidades de se posicionar politicamente. Essa diversidade de expressão é absolutamente essencial. Em God Exists, Her Name is Petrunya, por exemplo, a cultura masculina dominante na Macedônia é desmontada satiricamente, assim como os abusos sistemáticos dentro da Igreja Católica em Grâce à dieu. Já Skin é a história real de grupos de ódio, enquanto What She Said: The Art Of Pauline Kael retrata Kael – uma das poucas ícones no campo da crítica cinematográfica.
Egor Moskvitin – Rússia: A arte é sugestiva: ela pode imprimir no espectador modelos de pensamento e ações. Há casos de revoluções que eclodiram depois de encenações teatrais. Por isso a crítica se sente tão entusiasmada com filmes que refletem as posições sócio-políticas de seus autores e autoras. Acho importante que a comunidade de profissionais do cinema dê liberdade a diretoras e diretores – inclusive a liberdade de participar ou não de debates atuais e o direito de viver no futuro, não apenas no presente. Os filmes de viés político que me entusiasmaram este ano foram Official Secrets e The Report (exibido no Festival de Sundance), bem como Vice e Grâce à dieu (exibido na Berlinale). O filme de François Ozon é literatura francesa de alto calibre. O filme de Adam McKay aborda temas difíceis com uma linguagem compreensível e ao mesmo tempo fascinante.
Alva Gehrmann - Noruega: Nem todo cineasta se sente em condições de criar obras políticas – e está bem assim. Mas aqueles que querem contar uma história crítica deveriam receber os devidos incentivos adequados. Pois filmes como Midnight Traveler, por exemplo, trazem uma nova visão sobre a situação dos refugiados. O diretor afegão Hassan Fazili documenta uma viagem de vários anos com sua família pela Europa. Fazili, sua mulher, que também é cineasta, e sua filha mais velha, fizeram esse filme usando apenas seus celulares.
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Gerasimos Bekas - Grécia: É frequente que sejam atribuídas dimensões políticas a filmes que eu simplesmente não acredito que eles tenham. A controvérsia política é, em primeira linha, um argumento para a venda dos filmes, um caminho para comercializá-los e inseri-los na conversa. Quando filmes tratam de acontecimentos políticos, eles podem ser uma forma de depoimento a respeito do assunto em questão. Mas a tendência é normalmente explorar a dimensão política, porque ela traz boas histórias.
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Noha Abdelrassoul - Egito: Na maioria dos filmes que vi durante a Berlinale, foram abordados temas políticos. Talking about trees foi o que, na minha opinião, conseguiu fazer isso da melhor forma e com mais naturalidade. Esse foi também o caso de An Unaired Interview.
Jutta Brendemühl - Canadá: Kosslick declarou a frase “o privado é público” como lema da Berlinale deste ano. Uma máxima pela qual muitos diretores evidentemente tomaram como bandeira. No entanto, a maioria dos filmes (ocidentais) que vi ficaram confinados em suas bolhas de #firstworldproblems e tiveram pouca relevância. Gully Boy, por outro lado, é um exemplo corajoso (e até divertido!) de um filme que discute criticamente a cultura do nosso presente: o drama indiano da roteirista e diretora Zoya Akhtar, se passa em um ambiente da florescente cena de hip-hop em uma comunidade muçulmana pobre de Mumbai, desmascarando abertamente opiniões obsoletas sobre temas como castas, religião e papéis de gênero. O filme transmite sua mensagem através de uma trilha sonora enérgica e eufórica, com trechos de texto como este: “É 2018 e esse país está em perigo. Sou artista e vou moldar o futuro. Essa é minha única religião e não orações fake”.
Andrea D'Addio - Itália: Não acho que os diretores deveriam se envolver mais politicamente. Todo filme trata de política, mesmo que isso não fique imediatamente visível. Vice, por exemplo, exibido na Berlinale deste ano, carrega uma mensagem política importante.