Digitalização e multilinguismo
“Mundo é língua”: por que faz sentido aprender línguas também em tempos de digitalização
Aprender uma nova língua demanda esforço. Hoje, a tecnologia inovadora nos ajuda a nos comunicar em diversas línguas. Será que os aplicativos tradutores vão tornar em breve a aprendizagem de uma língua algo desnecessário? O que acontecerá no cérebro, se não aprendermos mais nenhuma língua? E como podemos hoje redespertar o desejo de aprender uma língua? A professora dra. Michaela Sambanis e o professor Dr. Heiner Böttger nos fornecem, em uma conversa, conhecimentos surpreendentes das neurociências.
Por Stefanie Eisenreich e dra. Paula Scholeman
Frau Sambanis, vamos começar logo com uma pergunta provocadora: para que aprender hoje uma língua se já existem atualmente tantos programas de tradução bons?
A tecnologia nos distancia uns dos outros e nós sofremos com isso
Hoje nós já temos a possibilidade de conlocarmos um fone no ouvido por meio do qual podemos solicitar uma tradução simultânea em uma conversa. A senhora acha que justamente essa tecnologia vai fazer com que a aprendizagem de línguas estrangeiras se reduza no mundo todo?
Michaela Sambanis: Espero que não. Por um lado, nós naturalmente percebemos que é ótimo que temos essa tecnologia hoje, senão não poderíamos nos comunicar assim uns com os outros. Por outro lado, ela também nos distancia uns dos outros e nós sofremos com isso. Com ela, nós eliminamos uma dimensão inteira da interação. Independentemente disso, eu nem quero imaginar quais podem ser as consequências se as pessoas simplesmente não desafiarem mais seus cérebros nessa área. Consideremos, nesse contexto, o efeito Flynn. Durante várias décadas, nós pudemos observar que, em princípio, nos tornamos cada vez mais espertos. Há alguns anos, ele estagnou ou mesmo recrudesceu. O efeito Flynn nos leva à conclusão de que não aproveitamos mais nossa capacidade real em algumas áreas específicas. E é curioso que isso afeta principalmente uma das áreas na qual a tecnologia hoje desempenha um papel extremamente relevante, a navegação. Quem de nós ainda tem realmente em seu cérebro a imagem de uma cidade? Nós pegamos imediatamente o GPS e não sabemos mais, em princípio, que poderíamos nos orientar sem ele.Monolinguismo é probreza cultural
O que significa multilinguismo para uma sociedade?
Heiner Böttger: Eu estive em Auckland (Nova Zelândia) em 2015 em uma conferência sobre multilinguismo. Lá, um professor de maori começou a chorar após 15 minutos de sua apresentação. Por quê? O governo aparentemente fortemente influenciado pela Grã-Bretanha em sua política educacional havia decidido, pouco antes, que todas as escolas de lá deveriam iniciar com inglês como linguagem escolar geral. Agora é preciso saber que até 64 línguas insulares podem estar representadas em uma escola primária em Auckland. Se o inglês passar a ser a primeira língua escolar, as línguas insulanas indígenas morrem: nas gerações seguintes e conseguintes ninguém mais vai falá-las. E então os britânicos ainda atingiram, com sua influência sobre a política educacional referente à língua, aquilo que não tinham conseguido atingir com a colonização. Por meio da ditadura de uma única língua, aqui a exemplo do inglês na Nova Zelândia, nós somos testemunhas de um declínio cultural e do declínio das “Languages of origin”.
Afinal, essa ditadura da língua existe no mundo inteiro. Pois o inglês se impôs como língua universal.
A aprendizagem deve ser tangível e própria para o uso diário
Diferentemente do inglês, o alemão e o francês são consideradas línguas difíceis de serem aprendidas. Em que medida esses preconceitos desempenham um papel na aprendizagem de uma língua? O que torna a aprendizagem de uma língua atraente?
Michaela Sambanis: Nós sabemos naturalmente pelas pesquisas didáticas, mas também psicológicas, que as atitudes são, aqui, um importante fator de influência. Nós não podemos, porém, esquecer que justamente o inglês está muito presente em nossa vida. Ele é a língua da Internet e das mídias, é parte da cultura jovem. Nós nos sentimos à vontade com ele e, portanto, percebemos também no dia-a-dia: ele me é útil. As outras línguas são, via de regra, menos presentes, o que, naturalmente, contribui para a relevância da matéria. Interessantes são, nesse contexto, as pesquisas sobre tédio. Existem estudos que mostram o quão entediantes os alunos (em idade adolescente) acham as matérias escolares e por quê. Do ponto de vista dos alunos, música tem uma má avaliação, seguida de física e matemática. Inglês, por outro lado, é melhor avaliado, os alunos consideram essa matéria útil e podem aplicá-la diretamente. Eles podem dar sua opinião, discutir temas atuais e reconhecer uma ligação com o dia-a-dia. Esses são fatores que tiveram um papel na avaliação. Eles podem ser utilizados como incentivos. A aprendizagem deve ser tangível e própria para o uso diário, e principalmente ter uma relevância.Talento para línguas pode ser aprendido
Qual o papel do talento para línguas e em que medida ele pode ser detectado no cérebro?
Como barreiras linguísticas já surgidas podem ser superadas?