Reinventando SMETAK
Salvador

Entrevista Edbrass Brasil

Edbrass Brasil ©Edbrass Brasil
“Não há como pensar a música contemporânea sem a contribuição de Smetak”
 
Tuzé de Abreu gosta de se referir a Edbrass Brasil como um dos netos de Smetak. De fato, o músico, pesquisador e educador baiano tem na obra smetakiana uma inspiração, especialmente no que diz respeito à criação coletiva, aos hibridismos e à arte livre de gêneros ou limitações de linguagem. Edbrass lembra que, apesar de grande parte do trabalho de Smetak ter sido produzido na universidade, ele extrapola esse lugar. E completa: hoje, a produção de arte sonora feita no Brasil e que tem as Plásticas, os microtons e as improvisações como referências, acontece muito mais fora do ambiente acadêmico, em selos fonográficos independentes.
 
Certa vez, Smetak foi convidado a participar de um evento e não quis ir. Os músicos da universidade insistiram, dizendo que ele representaria seus contemporâneos. Smetak retrucou: “Contemporâneo? Eu estou 50 anos À frente!”. Como você acha que um artista com esse espírito viveria hoje, quando tudo é tão urgente e nem sempre sobra tempo para reflexões?
Smetak é um pensador fundamental e, felizmente, tem a nova chance de ganhar uma audiência, muito merecida e planetária. Não há como pensar a produção da música de vanguarda, experimental, exploratória, contemporânea, ou como queiram chamar, nos séculos 20 e 21, sem a contribuição dele. Acho que o perfil de artista que ele criou a partir dos anos 1970 está completamente sintonizado com os processos artísticos ativados na contemporaneidade, em que o artista é mais um “agenciador”, partindo de uma noção de agenciamento proposta por Foucault, aberto a colaborações, hibridismos e livre das amarras de um gênero ou linguagem artística única. O espírito de inovação contido em sua produção está ou esteve presente na prática de alguns artistas sonoros contemporâneos. Produzir arte hoje em dia continua tão desafiador quanto na década de 1970. Por vários motivos, Smetak tinha consciência de que a sua produção, que inclui muitos escritos, instrumentos, peças para teatro, além da produção fonográfica, necessitaria de um tempo maior para começar a ser apreendida de forma mais ampla. Acho que quem está mergulhado na arte conhece os seus limites, do ponto de vista da recepção, e não está focado na busca de um reconhecimento imediato.
 
Qual é o aspecto mais smetakiano de suas vivências artísticas?
A maior influência smetakiana na minha trajetória é a sua pesquisa com as Plásticas Sonoras e seus desdobramentos no campo da educação musical. Um outro aspecto muito relevante foi a importância do seu pioneirismo na pesquisa dos microtons no Brasil, além dos processos de composição com base nas vivências coletivas de improvisação.
 
Como você percebe a influência de Smetak entre os artistas de sua geração?
No Brasil, se formos pensar no campo de produção da arte sonora que está desassociada da vida acadêmica, essa influência pode ser notada na produção de alguns artistas. Seja na pesquisa do material sonoro ou nos processos composicionais. Ressalto a produção não acadêmica, pois é aí que se encontram os selos fonográficos independentes que estão empenhados em difundir esta faixa da produção musical contemporânea. Podemos citar como exemplos o QTV (RJ), Seminal Records (MG), Sê-lo! (BA). Embora nomes como Marco Scarassati, que está ligado à academia, consiga circular por ambos os universos, eu sinto a maior presença de Smetak fora das universidades e acho que ele adoraria saber disto. “Salve-se quem souber!”, como diria ele.