O segundo livro de contos e narrativas breves de Clemens J. Setz lembra um pouco os Contos do Inesperado (Tales of the Unexpected) de Roald Dahl. O inesperado é, de facto, o fio condutor destas narrativas, que vão desde a meia página até à extensão e trama de uma quase-novela.
O leitor é confrontado, a cada momento, com o inesperado, no sentido em que as suas expectativas de leitura são sistemática e paulatinamente frustradas. O detalhe, a minúcia, tanto na condução da narrativa como na composição das personagens, são um dos grandes trunfos desta escrita que envolve e prende o leitor dentro do insólito das situações e personagens.
Os textos são povoados de situações-limite e personagens-limite, quer dizer, situações e personagens que o leitor tem dificuldade em identificar: esta situação é consequência de uma doença? De uma insanidade? Esta linguagem é possível? Esta personagem é um criminoso? Tem uma doença mental? É um animal ou um ser humano? Ou outra coisa qualquer, indefinível?
De uma ironia suave, quase humorística, os textos exploram universos humanos que ficam habitualmente sob o limite do visível: processos e estratégias mentais, fantasias, imaginários, medos, ansiedades inconfessáveis, linguagens pessoais e intransmissíveis, colocando as personagens na fronteira do incomunicável.
Ao testar todos estes limites nos seus contos, Clemens J. Setz põe o leitor continuamente à prova na sua capacidade de ler, nos seus automatismos de leitura, criando continuamente plataformas de incerteza que obrigam o leitor a rever a forma como aborda um livro, um conto, uma personagem, o mundo