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O Acordo de Glasgow
Construir uma agenda pela justiça climática do movimento

A nossa voz é importante para interromper o business as usual que provoca a crise climática.
A nossa voz é importante para interromper o business as usual que provoca a crise climática. | Foto (detalhe): © Pedro Alvim

Passados 25 anos de COPs, protestos e manifestações, as emissões continuam a aumentar. O que nos está a impedir de avançar? O Acordo de Glasgow propõe um plano que promete um passo em frente no movimento. 

Enquanto ativistas, perguntamo-nos muitas vezes se os nossos protestos estão a ser bem sucedidos: estamos a fazer passar a nossa mensagem de forma clara? As empresas e governos que criticamos sentiram-se incomodados? Estamos a aumentar o nosso espectro de aliados, cativando novas pessoas a juntarem-se a nós? Conseguimos acender um debate público sobre o tema que abordámos? 
 
No artigo anterior, as bloggers de Espanha contam-nos como é que os ativistas espanhóis olham para a COP, e qual será o impacto da COP26. Mas, e se o movimento já não tiver tempo para esperar por mais uma ronda de negociações? Porque há um dado claro: mesmo apesar de todos os protestos, marchas e manifestações, as emissões continuam a aumentar. 

Desobidiência civil contra o business as usual

Por isso, nos últimos dois anos, o movimento tem organizado vários protestos que envolvem desobediência civil, isto é, o ato de consciente e coletivamente escolher violar ou ignorar a lei para um propósito político claro. Porquê participar e organizar desobediência civil? Falei com a Alice, ativista no Climáximo, que me disse:“ Se a nossa casa está a arder nós temos de parar tudo o que estamos a fazer e interromper o business as usual. Nós temos o dever de desobedecer a leis injustas”. A lei nem sempre equivale à moralidade, e, neste momento, o que estão a fazer com o planeta é perfeitamente legal. 
 
A verdade é que o movimento por justiça climática tem pouco tempo para mudar tudo. Por isso, precisamos de um plano que ponha no próprio movimento a responsabilidade de coletivamente cortar as emissões de GEE, uma vez que os governos e as instituições continuam a falhar. É exatamente isso que o Acordo de Glasgow propõe. O objetivo é “(...) usar a desobediência civil como a nossa principal (mas não exclusiva) ferramenta para obter os cortes de emissões necessários para evitar um aumento de temperatura de 1.5ºC em 2100”. O texto foi escrito por dezenas de organizações ao longo de oito meses e foi assinado em Outubro de 2020, quando mais de 80 organizações de todo o mundo assumiram nas suas próprias mãos a responsabilidade de cortar 50% das emissões do GEE até 2030.A ideia inicial surgiu depois de (mais uma) COP falhada, a COP25 em dezembro de 2019, em Madrid: a frustração provocada pela impotência das instituições levou à necessidade de pensar num plano concreto de escalamento para o movimento por justiça climática. 

O Acordo de Glasgow em Portugal

Através da construção de um inventário de informação desagregada das emissões nacionais e de uma agenda pela justiça climática baseada neste, o Acordo de Glasgow propõe um rumo para o movimento. Mariana, ativista no Fridays for Future Portugal e participante na construção do Acordo de Glasgow desde o início, afirma que “toda a gente sabe que a nossa casa está a arder, mas ninguém apresenta um plano para combater o fogo”. 
Inventário das emissões por setores em Portugal (2018) O inventário das emissões por setores em Portugal realizado pelo Acordo de Glasgow (2018) | Imagem: © Glasgow Agreement Em Portugal, o Climáximo e a Greve Climática Estudantil (FFF PT) foram as organizações que se comprometeram a fazer parte deste plano. Em março, apresentámos pela primeira vez o inventário das emissões desagregadas de Portugal - um raio-x do sistema produtivo que nos permitiu identificar as infraestruturas e empresas mais emissoras de Portugal. Agora, estamos a construir o espaço da Agenda pela Justiça Climática, onde iremos definir quais as prioridades de cortes de emissões, baseadas no inventário, em conjunto com grupos de comunidades locais e dos movimentos antirracistas, pela habitação, feministas, entre outros. A nossa Agenda por Justiça Climática será depois articulada com agendas de outros países, criando planos de ação regionais e internacionais. 
 
O Acordo de Glasgow diz-nos que é a crença no sistema e nas instituições que nos está a impedir de atingir as nossas metas. A chave para a mudança de que precisamos está nas mãos do nosso movimento e na necessidade de tomarmos ação confrontativa e criarmos um plano social justo das pessoas para as pessoas.
 
Nós somos aquelas de quem estávamos à espera para combater o fogo. 
 
No próximo artigo, mergulhamos no tópico das ações individuais: será que a sua importância cultural se traduz em ação eficaz?