Modernas composições espaciais  O arquiteto Mies van der Rohe como artista visual

Ludwig Mies van der Rohe | Casa Resor, projeto (Jackson Hole, Wyoming): perspectiva da sala de estar através da parede sul de vidro. 1937-1941 (não construído). Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe
Ludwig Mies van der Rohe | Casa Resor, projeto (Jackson Hole, Wyoming): perspectiva da sala de estar através da parede sul de vidro. 1937-1941 (não construído). Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe © The Museum of Modern Art, Nova York/Scala, Florença / VG Bild-Kunst, Bonn, 2016

“Nunca penso em uma imagem, quando quero construir uma casa”, afirmou Mies van der Rohe numa entrevista concedida à revista Bauwelt em 1964. Apesar disso, produziu muitas colagens e montagens. Essas composições espaciais estão entre as mais belas e interessantes obras da Modernidade.

Ludwig Mies van der Rohe (1886–1969) é um dos arquitetos de maior destaque da Modernidade. Em sua cidade natal, Aachen, Mies teve contato com os fundamentos do ofício da construção. Com Peter Behrens, em Berlim, o jovem arquiteto aprendeu tudo sobre a “grande forma”. Quando a sociedade burguesa do Império Alemão, marcada pelos ofícios, desmoronou na Primeira Guerra Mundial, a arquitetura e a criação de arte também mudaram fundamentalmente. Experimentação e otimismo inspiraram projetos revolucionários. O Pavilhão de Barcelona de Mies van der Rohe, com sua fluidez espacial, expressava a nova abertura da República de Weimar, mas também a aspiração a ordem e moderação.

Mies van der Rohe, Ludwig (1886-1969) | Projeto do Museu Georg Schaefer, Schweinfurt, Alemanha, Perspectiva interna com vista lateral, 1960-1963. Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) arquivo Mies van der Rohe Mies van der Rohe, Ludwig (1886-1969) | Projeto do Museu Georg Schaefer, Schweinfurt, Alemanha, Perspectiva interna com vista lateral, 1960-1963. Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) arquivo Mies van der Rohe | © The Museum of Modern Art, New York/Scala, Florença / VG Bild-Kunst, Bonn, 2016 Como seu último diretor, Mies van der Rohe estabeleceu na Bauhaus o ensino sistemático de arquitetura. Por meio de clareza na estrutura, a nova arte da construção deveria fazer frente ao caos do mundo moderno. Foi apenas tardiamente que Mies van der Rohe abandonou a Alemanha governada pelos nazistas, tendo continuado a desenvolver em Chicago seu conceito de formação em arquitetura. Edifícios de elegância abstrata tornaram Mies van der Rohe definitivamente conhecido em todo o mundo. Sua última grande obra foi a Nova Galeria Nacional, inaugurada em 1968 em Berlim. Enquanto viveu, o arquiteto desenvolveu seus projetos a partir da sobreposição de condições concretas e ideias gerais. Isso raramente se mostra de maneira mais clara que em suas numerosas montagens e colagens. Em especial nos períodos de reorientação, surgiram arquiteturas imagéticas cuja fascinação perdura até hoje.

Indeterminação de tempo e espaço

As colagens e montagens revelam uma justaposição e coexistência de continuidade e de recomeço. Já cedo, Mies van der Rohe se orientava pelas colagens fantasiosas da vanguarda artística. Propagandas e experimentos contemporâneos com filmes apresentavam a metrópole moderna como lugar de movimento. Em 1922, surgiram as sugestivas fotomontagens de seu prédio na rua Friedrichstrasse, em Berlim. Elas passam a impressão de movimentos de câmera congelados, transmitindo uma imagem dinâmica da cidade e da sociedade como um todo. Com a emigração para os Estados Unidos, as representações de espaços urbanos foram cedendo lugar a imagens de espaços internos. Essas perspectivas em grande escala atraem o observador para dentro da imagem. Em inúmeras colagens de Mies van der Rohe veem-se reproduções de obras de arte.

Ludwig Mies van der Rohe | Museum for a Small City,1942-43. Perspectiva interna. Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe Ludwig Mies van der Rohe | Museum for a Small City,1942-43. Perspectiva interna. Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe | © The Museum of Modern Art, New York/Scala, Florença / VG Bild-Kunst, Bonn, 2016 Esculturas figurativas de Aristide Maillol e Wilhelm Lehmbruck encontram-se livres no espaço. Painéis enormes com pinturas de Picasso e Klee tornam-se elementos integrais da arquitetura. A presença de esculturas e pinturas nas paredes colocam observador e espaço pictórico numa relação dinâmica pulsante. O olhar do observador é atraído para a profundeza da composição espacial mas fica, ainda assim, preso à superfície. No entanto, as relações dimensionais revelam-se vagas. As esculturas são realmente em tamanho real? É nessa ambivalência de medidas que se baseia a capacidade das colagens de manter a dinâmica entre presença e dimensão espacial e de cativar o observador. Através dessa alteração inquieta de proporções e da dissolução das relações costumeiras, Mies van der Rohe capta a sensação de indeterminação de tempo e espaço. O observador é sugado para dentro da espaço pictórico em expansão da nova arquitetura e, com isso, também para o turbilhão dos tempos modernos.

Inovador e enigmático

Ao se observar bem de perto e em detalhes, revela-se nas colagens o seguinte jogo de alternâncias: por um lado, um futuro moderno é anunciado com precisão técnica, enquanto, por outro, os traços da produção artesanal de imagens permanecem claramente visíveis. Às vezes, peças de compensado cuidadosamente cortadas são incorporadas a desenhos de traços exatos.

Mies van der Rohe, Ludwig (1886-1969) | Salão de convenções, Chicago, Illinois, 1952-54. Perspectiva interna. Versão preliminar, 1953. New York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe Mies van der Rohe, Ludwig (1886-1969) | Salão de convenções, Chicago, Illinois, 1952-54. Perspectiva interna. Versão preliminar, 1953. New York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe | © 2016. The Museum of Modern Art, New York/Scala, Florença Contrastando com a ordem racional de uma ampla armação de teto, a intensa coloração dourada da superfície de uma parede surpreende, bem como a pequena bandeira de tecido que paira sobre uma multidão composta por fotos de revista. Ocasionalmente pode-se encontrar traços da ironia e do humor seco de Mies: uma pintura de Kandinsky está virada, um Buda antigo está tranquilamente sentado entre esculturas modernas, a vista da janela panorâmica para um de seus projetos norte-americanos iniciais mostra alguns caubóis de filmes.

Ludwig Mies van der Rohe | Projeto para sala de concertos, 1942, Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe Ludwig Mies van der Rohe | Projeto para sala de concertos, 1942, Nova York, Museum of Modern Art (MoMA) Arquivo Mies van der Rohe | © The Museum of Modern Art, New York/Scala, Florença / VG Bild-Kunst, Bonn, 2016 Nas representações espaciais de Mies van der Rohe, mesclam-se a objetividade do arquiteto construtor e a sensibilidade de um artista visual. A técnica artística da montagem acompanhou o arquiteto por toda sua vida. Já em suas colagens, Mies van der Rohe sintonizava precisamente a parte e o todo. Da mesma forma, a estrutura da construção como um todo se expressa em seus detalhes construtivos. Para além do mero propósito útil, as colagens e montagens de Mies van der Rohe denotam sua independência artística. Ainda hoje são consideradas inovadoras e enigmáticas. As modernas composiçõess espaciais de Mies van der Rohe já pertenciam à vanguarda artística antes que suas construções tivessem semelhante efeito revolucionário para a arquitetura.

Acompanhando a exposição “Mies van der Rohe: As colagens do Museu de Arte Moderna de Nova York”, no Fórum Ludwig em Aachen e no Museu Georg Schäfer, em Schweinfurt, de 26 de fevereiro a 28 de maio de 2017, foi publicado um catálogo com ilustrações abundantes e cuidadosamente comentado. MIES VAN DER ROHE: MONTAGE. COLLAGE, Aachen, Ludwig Forum. Andreas Beitin, Wolf Eiermann & Brigitte Franzen (org.). Aachen/Schweinfurt 2016/17.

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