Séries alemãs  “Depois da cabana” – o sequestrador na sua cabeça

Reviravoltas inquietantes, artimanhas narrativas abruptas, atmosferas aterrorizantes em grande escala e uma garota misteriosa no meio de tudo. A mistura de horror e alta tensão que vicia o espectador fez com que a série de terror psicológico de seis espisódios, com roteiro e direção de Isabel Kleefeld e Julian Pörksen, se tornasse um dos maiores sucessos da Netflix em todo o mundo – e uma verdadeira festa para notívagos com nervos de aço.

“Ele cria o dia e a noite. Como Deus”

Em uma cabana sem janelas, situada em algum lugar no meio do nada, as duas crianças Hannah (Naila Schuberth) e Jonathan (Sammy Schrein) estão entregues às regras draconianas do “pai”. A mãe (Kim Riedle) encontra-se na mesma situação. As refeições, a educação domiciliar e até mesmo as idas ao banheiro são severamente reguladas. Os procedimentos do pérfido jogo familiar devem ser meticulosamente respeitados. Quando a mulher chamada Lena consegue, em uma noite, escapar de sua prisão de segurança máxima, ela cambaleia na frente de um carro em uma estrada no meio de um bosque e acaba indo parar no hospital. Sendo assim, parece estar a salvo de seu algoz. Ou não? Junto com ela, foge também Hannah, uma menina de 12 anos. “Estou com você, mamãe”, sussurra a garota para a mulher gravemente ferida dentro da ambulância. Ela está encorajando a mulher? Ou isso é uma ameaça? Para a fugitiva, a viagem de terror está longe de chegar ao fim.

"Essas são as regras, Lena!"

Depois da cabana começa justamente onde a maioria dos filmes de suspense acaba. A série de seis episódios mostra os efeitos do sequestro e do abuso como um quebra-cabeça intrincado e apavorante, onde nada parece se encaixar. Flashbacks revelam fragmentos de acontecimentos só para trazer novas questões. Quem é, na verdade, Lena? É a filha do casal Beck (Julika Jenkins e Justus von Dohnányi), desaparecida há 13 anos, como seu pai Matthias espera fervorosamente? Hannah e Jonathan são realmente filhos biológicos de Lena? Há mais de um sequestrador? Qual o papel de um globo de neve estilhaçado? E o que está por trás do comportamento estranho da pequena Hannah? Enquanto Aida Kurt (Haley Louise Jones) e Gerd Bühling (Hans Löw), investigadores do Departamento de Polícia Criminal Estadual, se dedicam ao caso cada vez mais complexo e desvendam outras atrocidades, “Lena”, altamente traumatizada, tenta aos poucos retomar sua vida. No entanto, a voz do sequestrador continua a ressoar em sua cabeça: “Se você não fizer exatamente o que eu disser, eu te mato. Se você pensar a coisa errada, eu te mato. Essas são as regras, Lena!”. Seriam esses os efeitos posteriores de uma lavagem cerebral diabólica ou seu torturador ainda consegue observá-la? A solução do enigma guarda um choque final – pelo menos para quem não conhece o romance da escritora Romy Hausmann (Perfect Day), especialista em suspense policial.

Panorama de um horror

Em sua premiada estreia com Perfect Day (2019), Hausmann brilhou como mestre do suspense psicológico. O livro envolvente, com narrativa sinuosa e de múltiplas perspectivas, brinca habilmente com as convenções do gênero e deixa insones até mesmo leitores vorazes com nervos de aço. “O panorama de um horror que supera toda a imaginação humana”, escreveu a editora dtv por ocasião da publicação do livro. Isso pode soar como um certo exagero, mas, no best-seller, não faltam cenários de terror: perseguição, sequestro, estupro, terror psicológico, tortura, assassinato – o livro não deixa nada de fora.

E a adaptação para as telas é arrebatadora da mesma forma? Com certeza, afirmam os fãs de suspense em todo o mundo. A série de seis episódios entrou para o ranking das dez séries da Netflix de maior sucesso de todos os tempos em outros idiomas que não o inglês –algo nada comum para uma produção alemã. “Uma peça de câmara criminal de primeira classe”, escreveu o site Spiegel Online sobre essa “série sombria e emocionante, que tem coragem de fazer perguntas incômodas”. A agência RedaktionsNetzwerk Deutschland elogiou a protagonista Kim Riedle (Back For Good), conhecida por vários suspenses policiais na TV e pela novela alemã Verbotene Liebe: “Há um horror nos seus olhos que nos lembra Shelley Duvall em O iluminado (1980)”, de Stanley Kubrick”. E o diário Süddeutsche Zeitung alertou ainda que Depois da cabana não é para pessoas “que só têm tempo” para um episódio: “Ser obrigado a desligar a TV com toda essa tensão é terrível”, opinou o jornal. O fato de a série de seis episódios prender o espectador até o último minuto se deve, em grande parte, à premiada roteirista e diretora Isabel Kleefeld (vencedora do Prêmio Grimme por O mundo de Arnie) e ao dramaturgo Julian Pörksen (Prêmio DEFA por O que acontece depois), que compartilharam o trabalho de roteiro e direção. Kleefeld, a roteirista principal, explicou ao site netflixwoche.de por que ficou tão fascinada com a história: “Depois da cabana é diferente, porque a história é contada só do ponto de vista da vítima e nunca do ponto de vista do agressor”. Isso, segundo ela, “atraiu muito” a atenção dos dois cineastas.

A escritora Romy Hausmann, por sua vez, ficou entusiasmada com a minissérie – e de início impressionada com a dimensão do projeto: “Foi uma verdadeira loucura. Estive no set por um dia e pensei: Oh, meu Deus, isso não está acontecendo!”. Ainda não se sabe se haverá outras adaptações de seus romances. Os fãs de Hausmann podem reduzir o tempo de espera ouvindo os podcasts Hausmann & Benecke – true crime e Tatort encontra o true-crime. Neste último, a escritora e o jornalista Florian Gregorzyk comparam os temas tratados nos suspenses veiculados pela TV alemã conhecidos como “Tatort” com casos de crimes reais. Fator de risco para noites sem dormir: alto.

Depois da cabana
Seis episódios de aprox. 45 minutos cada
Alemanha/EUA, 2023
Roteiro e direção: Isabel Kleefeld, Julian Pörksen
Elenco: Kim Riedle, Naila Schuberth, Sammy Schrein, Julika Jenkins, Justus von Dohnányi, Hailey Louise Jones, Hans Löw, Birge Schade, Ozgur Karadeniz
Recomendada para maiores de 16 anos

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